Relógios a quartzo: baratos e práticos, mas sem glamour

A revolução do quartzo, iniciada pela Seiko em 1969, mudou a geografia, o preço e a precisão dos relógios para sempre.

Quais são as vantagens de um mecanismo a quartzo sobre os movimentos mecânicos? Por que esses relógios são normalmente desvalorizados no mercado de luxo?

Como vimos em um artigo anterior, os relógios podem medir a passagem do tempo de diferentes formas, e o quartzo tornou-se a mais comum delas.

O mecanismo baseado no quartzo funciona através da corrente elétrica fornecida pela bateria, que faz o cristal vibrar a uma frequência conhecida, e o tempo é registrado em um contador eletrônico.

Durante a fabricação, o cristal pode ser cortado e polido de diversas formas, o que resulta em diferentes frequências de vibração. Nos relógios atuais, essas oscilações ocorrem 32.768 vezes por segundo, algo nunca imaginado na indústria relojoeira anteriormente. Como base de comparação, os mecanismos suíços mais comuns (ETA 2824, Rolex) vibram a uma frequência de 4Hz

Essa frequência altíssima do quartzo permite uma precisão na medida do tempo jamais alcançada pelas formas tradicionais de produzir relógios de pulso, com o uso de rodas de balanço e escapamentos.

Esse valor de 32.768 não foi escolhido por acaso, ele corresponde ao número 2 elevado à 15ª potência. Como o mecanismo contador dos relógios a quartzo é eletrônico, ele funciona com o sistema binário, e ajustar as vibrações a uma potência de 2 tornou tudo possível.

É muito comum ouvir as pessoas reclamarem que seus relógios de milhares de dólares (Rolex, IWC, Cartier, Tag Heuer) são muito menos precisos que os que custam 100 dólares ou menos. E isso é a mais pura verdade.

Há mais de um século as marcas se esforçam para produzir relógios mecânicos mais precisos, usando materiais inovadores (silicone, ligas metálicas), complicados mecanismos (escapamento duplo, turbilhão), mas os melhores mecanismos atingem precisão de -4 ou +6 segundos por dia, o máximo de variação aceitável para um movimento mecânico receber a certificação de cronômetro pelo instituto de medida suíço (COSC). O mesmo instituto considera a máxima variação aceitável para certificar um modelo a quartzo apenas + ou – 0.07 segundos por dia, ou seja, quase 100 vezes mais preciso. Isso considerando condições ideais de funcionamento e lubrificação, o que interfere muito mais nos relógios a corda/automáticos.

Como a fabricação dos relógios a quartzo envolve muito menos peças, e abre mão das engrenagens mais delicadas (barril, roda de balanço, escapamento), o preço de produção também é bem inferior, e pode ser automatizada de forma muito mais simples. Assim, o preço final também acaba sendo muito menor, em média, comparado aos relógios mecânicos da mesma marca.

Outra grande diferença é que, como recebem a energia para funcionar de uma bateria com capacidade para anos de funcionamento, em contraste com a capacidade de menos de 100 horas dos mecânicos mais capazes, os relógios de quartzo são muito mais simples de manter em funcionamento, sem necessitar de intervenção manual todo dia, ou ficar em caras caixas de rotação automática.

Mas, se eles são mais baratos, mais precisos, e de manutenção muito mais simples, por que os relógios de quartzo são tão menos apreciados pelos amantes da horologia?

A resposta está no fato que a precisão de medida do relógio de pulso deixou de ser algo tão importante, nos dias de hoje. Na prática, todo mundo tem no bolso um telefone que sincroniza as horas com um servidor central, calibrado com relógios atômicos, com precisão praticamente perfeita. Dessa forma, mais importante que a hora exata, o que um relógio tem é a qualidade, a história, a beleza, a singualaridade, o status.

Aqui, cabe um paralelo com a arte. A foto é uma reprodução perfeita de uma paisagem, mas ter um quadro da mesma paisagem pintado por um artista famoso, apesar de muito menos preciso, custa muito mais.

O relógio mecânico demanda tempo, dedicação, precisão para ser confeccionado. Existe algo de mágico em saber que, com apenas o movimento do seu braço, ou com apenas o ato de dar corda pela coroa, aquele aparelho pode funcionar para sempre. A engenharia envolvida, os séculos de invenção, aperfeiçoamento, tudo isso entra no jogo, a favor do relógio a corda.

Já o relógio a quartzo é um produto industrial, dependente muito mais de calibragem em série de uma máquina do que do cuidado individual com cada peça.

Por isso os amantes da horologia moderna vão sempre admirar mais os relógios mecânicos, cada um com sua história, cada um com toda a história da humanidade, lutando para marcar o tempo.

Relógios a quartzo nunca terão esse charme.